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Aos 60, Escola de Música de Brasília é símbolo de boa educação musical
Publicado em 10/04/2024

Pela instituição, que atende a milhares de alunos a cada ano, passaram Cássia Eller, Ney Matogrosso, Zélia Duncan e Lula Galvão

Por Fabrício Azevedo, de Brasília

Alunos durante uma aula na EMB. Divulgação: Álvaro Henrique / Ascom SEEDF

Nos últimos 60 anos, o Brasil entrou e saiu de uma ditadura, consolidou suas instituições democráticas, teve governos de esquerda, centro, direita e até extrema direita e viu como nenhum deles foi capaz de implementar nacionalmente um sistema amplo e funcional de educação musical. Nestas mesmas seis décadas, um bom exemplo de ensino de alta qualidade se manteve relevante e ajudou a formar gerações de instrumentistas, cantores líricos e populares, inclusive nomes de destaque como Cássia Eller, Ney Matogrosso, Zélia Ducan, o guitarrista e arranjador brasiliense Lula Galvão e o violonista carioca Jaime Ernest Dias.

Gratuita, democrática e plural, a Escola de Música de Brasília (EMB) completa seis décadas com boa saúde — e consolidando-se como uma fórmula a seguir para popularizar o estudo musical na rede pública.

Vice-diretor da escola, Daniel Baker Méio lembra que sua criação, em 1964, foi uma iniciativa do maestro Levino Ferreira de Alcântara.

“Na verdade, estamos comemorando um duplo aniversário. A sede definitiva foi inaugurada há 50 anos, em 11 de março de 1974”, diz, destacando que o maestro Levino praticamente “invadiu” o terreno localizado no final da via L2 Sul, próximo à Esplanada dos Ministérios, tornando a instituição rapidamente um símbolo do Distrito Federal. “Não conheço nenhum músico da cidade que não tenha passado por algum curso nosso, nem que fossem os cursos de verão.”

Para ingressar na EMB, o aluno deve se submeter a uma prova de seleção. As vagas são voltadas principalmente para alunos de colégios públicos de Brasília e músicos que buscam aprimoramento. Vagas remanescentes são distribuídas para a comunidade. Entre os cursos estão piano clássico e popular, violão clássico e popular, canto lírico, violino, trombone, madeiras, musicalização infantojuvenil e vários outros.

O vice-diretor, Daniel Baker Méio. Arquivo pessoal

“O edital de seleção é publicado semestralmente, e em média são abertas 300 vagas, sendo que hoje atendemos a cerca de 2.400 alunos simultaneamente”, explica Alessandro Alcântara, secretário da escola. “Nossos alunos são capacitados para tocar no mercado musical, participar de orquestras e outros conjuntos e ainda dar aulas de musicalização em colégios públicos e particulares.”

Para a comunidade são oferecidas apresentações, oficinas e os tradicionais cursos de verão. Toda a informação pode ser encontrada na página da EMB ou, no caso dos editais de convocação, também no Diário Oficial do Distrito Federal.

Música e a construção da cidadania

Os cursos de verão que Alcântara menciona foram outra criação do maestro Levino, no ano de 1978. Na opinião da pianista e professora aposentada da escola Elenice Maranesi, eles foram fundamentais para consolidar e ampliar o papel da EBM.

“Com os cursos, pudemos trazer músicos de todo o mundo e fazer uma experiência de imersão em diversos estilos e trocar experiências”, comenta.

De acordo com a professora, muitos dos músicos que assistiram às palestras e participaram das oficinas se tornaram alunos — alguns viraram até professores da escola. Mas, mesmo quando um aluno não segue uma carreira na música, passar por uma escola como esta o torna um especial apreciador da arte, o que tem impacto em diferentes aspectos da vida. Maranesi diz que isso vai exatamente na linha de um dos maiores objetivos do maestro Levino.

“Ele sempre acreditou que a música não era só uma formação artística ou profissionalizante, mas, acima de tudo, uma ferramenta para criar cidadania”, afirma. “A educação musical torna os alunos mais sensíveis e mais capazes de explorar todas as suas capacidades.”

Mudanças de vida

Daniel Baker Méio destaca que muitos alunos têm de fato uma mudança em suas vidas com a formação que recebem.

“A escola já teve a fama de ser elitista, supostamente atendendo só a alunos de áreas mais ricas, como o Plano Piloto. Mas uma pesquisa que fizemos mostrou que quase 70% dos alunos vêm de outras regiões administrativas do Distrito Federal e de periferias”, comenta, acrescentando que a escola dispõe dos instrumentos para que os alunos sem condições de comprá-los possam ter pleno rendimento.

Janete Dornellas, professora da EMB e colega de turma de Cássia Eller. Foto: Reprodução Valter Campanato/Agência Brasil

Cria da EMB, a professora de canto lírico, arranjo e dicção há 12 anos, Janete Dornellas concluiu o doutorado na Universidade de Brasília antes de voltar à escola como docente.

“Sentia falta do ambiente das pessoas tocando nos corredores, dos grupos ensaiando. Como muitos professores, fui aluna dessa instituição e devo a ela muito da minha formação”, observa a profissional, que, quando jovem, foi da turma de Cássia Eller na EMB. “Cursamos várias aulas juntas, e ver o talento dela foi uma inspiração para eu me esforçar mais. Mudou a minha vida.”

Relações que se mantêm ao longo da carreira

Professor de bateria na escola desde 1998, Paulo Marques diz que, além de propiciar formação, a EMB é um centro de criação musical e permite construir uma rede de contatos preciosa para quem viverá de música.

“Muitos músicos experimentados vêm estudar conosco e se aprimorar, mas alguns têm suas primeiras oportunidades profissionais na escola”, explica, lembrando o caso de um aluno que fez seu primeiro cachê musical tocando na orquestra do Teatro Nacional Cláudio Santoro, graças a contatos feitos na escola. “O engraçado foi a mãe dele vir me agradecer depois. Ela nunca imaginou que o filho tatuado, e que só andava de bermuda, ganharia dinheiro tocando música vestindo terno em uma orquestra”, ri.

O professor Marques também destaca o papel de ponto de encontro cultural para a cidade e até para além dela.

“Brasília tem vários públicos distintos, desde o pessoal do rock até a turma do sertanejo. Há espaço também para a música clássica e gêneros regionais que mesmo os professores não conhecem. Além dos cursos formais, as oficinas, cursos de verão e apresentações tornam a EMB um espaço democrático para esses grupos se encontrarem”, descreve.

O professor de bateria Paulo Marques. Foto: Arquivo pessoal

Composição

Atualmente, a EMB não tem um núcleo específico dedicado à composição, mas isso não impede que a vocação criativa surja. Um exemplo é o professor de arranjo Jessé Gomes de Souza.

“Fui aluno da escola e, agora, sou professor. As aulas de arranjo me deram muita base para começar um trabalho autoral”, afirma. “Muitos alunos seguem o mesmo caminho. Grande parte não tem conhecimentos para lidar com assuntos relacionados aos direitos autorais das suas obras, por exemplo. É muito importante que existam instituições como a UBC (para trazer essa informação).”

Com um sentido afiado de comunidade e amor pela música, os profissionais ali parecem se desdobrar para driblar as dificuldades. Apesar do seu papel de agregadora cultural em Brasília, a escola nem sempre tem à disposição todos os recursos financeiros de que precisa — e nem mesmo a compreensão, por parte das autoridades, da sua enorme relevância.

“Como somos uma escola pública, estamos sempre em busca de verbas”, diz o vice-diretor Baker Méio. “Muitas vezes, precisamos explicar até à Secretaria de Educação do DF como funciona nosso trabalho. As turmas são pequenas e, às vezes, o professor tem que dar aula a apenas um aluno. É um trabalho constante, tudo para garantir a formação correta de cada um.”

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